
Fomos apresentados por um cara que hoje não é mais tão íntimo. Na verdade um cara, que hoje não me dá a mínima e, no decorrer deste, talvez dê pra entender o (s) motivo (s).
Vivi, amei, brinquei, dei risadas, ouvi... E ouvi muito.
Parece que as coisas passam como um filme, num relance, numa forma estranha de ver a vida. Um jogo rápido de Slides, fotos e pensamentos.
Decidi entrar nessa. Estereotipei coisas que jamais deveriam ser visadas seja lá em qual momento for (leia-se deveriam, porque acredito que podem e devem)...
Achei tudo um barato, uma diversão momentânea barata e inocente. E, mesmo sabendo que essa diversão era falsa e nada inocente, simplesmente me deixei levar pelos pequenos momentos carnavalescos e dilaceradores ao final das cinco.
Mas no que acreditar? Levar as coisas a sério? Mudar? Acho que não era o que eu queria... E isso, porque seria muito difícil de me imaginar longe daquilo. Uma fuga talvez psicológica, talvez necessária, talvez costumeira, mas certamente uma fuga.
Pois bem, abusei, deixei de amar, deixei de olhar no fundo dos olhos, deixei de observar os detalhes da vida. Me importei com coisas banais, com futilidades. Deixei de ligar pra dizer "eu te amo", deixei de amar loucamente, deixei de rir em um domingo a tarde. Na verdade, qual domingo restaria? Deixei de viver com pessoas que amei para dar importância a essa maldita queimação de neurônio.
Com tudo isso, hoje estou eu aqui. Em uma casa grande, porém mal iluminada. Sem dinheiro, com apenas um resto de comida que aquela senhora vizinha deixou por aqui por sentir pena e, somente pena. Não tenho mais cama, mas graças a Deus ainda tenho a cadeira de rodas que me suporta. Aliás, foi a generosidade desta mesma senhora no Natal passado. Generosidade que nunca tive, afinal, nunca passei um Natal LIMPO e verdadeiro.
Dores? Pelo corpo todo. Por dentro, por fora e por dentro do íntimo.
Viver intensamente me deixou hoje, aqui, largado, abandonado, sem amigos, sem todo aquele glamour, sem mulheres, sem álcool, sem ao menos um rádio velho de pilhas pra saber o que se passa no mundo a fora.
Olho para os lados e vejo uma seringa muito velha, reaproveitada. Um pouco de sujeira branca e algumas "pedras da vida"...
Com uma altura considerável, hoje não devo passar dos meus 35kg. Acho até que as feridas pelo meu corpo e esse cheiro de carne mal lavada com pus que são responsável por esse pouco peso que resta. SIDA? Alguma outra coisa? Pode até ser, mas, pensar nessa possibilidade só faz com que eu tenha mais certeza de tamanha tolice.
Tenho tremores devido a ela. Tenho palpitações e, me falta o ar as vezes. Mas, hora essa que desejo que falte por completo, para acabar com todo esse sofrimento. Porém, acho que é a única forma de pagar um pouco do que fiz. Só espero que após o último suspiro, não demorem a me encontrar, pois não quero que sintam mais nojo de mim, apesar de eu achar que minha existência é mais nojenta do que um corpo escarnecido pelo ódio e pela exorbitância da vida.
Não sei o que é um banho quente. Aliás, pouco sei nos últimos meses o que é um banho. A única espuma que consigo ver é aquela que cai de minha boca quando tenho alguns dos muitos ataques. A água que vejo, é a das lágrimas que correm pela minha face.
Não tenho coragem de me olhar no espelho. Prefiro pensar que ainda sou o mesmo: feliz, sorridente, olhos brilhantes, bochechas rosadas e roupas limpas e novas. Com pessoas que me amam ao meu lado.
Alguns dias, sinto que estou simplesmente derretendo por dentro. A queimação maldita é infernal. É medonho demais perceber que você está morrendo pouco a pouco. Dia-a-dia, momento a momento.
Meus dedos sujos, calejados por essa maldita cadeira de rodas não possuem mais unhas bem-feitas e bonitas. Aliás, pouco dessa parte ainda me resta. Realmente é dolorido empurrar essas rodas sem ter muitas unhas.
Mas é o preço que estou pagando por quase matar minha família toda, amigos, pessoas que amei... Matar em sentidos físicos, morais e sentimentais.
É... Ela é a responsável. Uma paixão inigualável, uma delícia...
É por ela que hoje, deixei de comer, é por ela que ainda fico feliz em receber esmolas. É por ela que estou aqui, jogado à vida. É por ela que adorei promiscuidade. É por ela que deixei de sentir o que deveria sentir. É por ela que não mudei. Ela me escravizou e, hoje, é minha única companheira nos dias próximo a minha morte.
Aquela coisa que pode ser um pó branco, um cigarro proibido, umas injeções venosas ou até mesmo alguns tabletes caros... Aquela coisa que me faz fugir... Aquela delícia imoral e várias pessoas diferentes (leia-se troca de comapanheiros). Aquela auto-afirmação vaga. Aquela coisa que jamais terminou... Aquele tanto de coisas simples... Aquele monte de coisas que não é necessário esforço pra ter, fazer ou conseguir.
E hoje só me resta uma dúvida: Morrer acompanhado por animados ou morrer acompanhado por inanimados?
Já decidi! Mas se um dia eu conseguir voltar a dizer algumas coisas, eu direi, afinal, agora é hora de mais um pouquinho de "nostalgia barata"...
Marcelo Sendon
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